terça-feira, 5 de maio de 2009

Causas e consequências

Uma triste farsa


Por: Constança Cunha e Sá, Jornalista

Não há nada como uns borrifos de água e meia dúzia de insultos despropositados para fazer de cada um de nós um democrata de gema, incapaz de conviver com a intolerância alheia e o sectarismo que tão bem caracteriza os ímpetos da populaça.
Como parece óbvio, se o dr. Vital Moreira, num acesso de boa vontade, decide passar parte do seu dia em franco e ameno convívio com os manifestantes do 1º de Maio, seria de esperar que estes o saudassem alegremente, com vivas ao Governo e palmas às suas políticas. Infelizmente, os manifestantes não tiveram essa presença de espírito: em vez de o colocarem num andor, levado em glória por sindicalistas agradecidos, deixaram-no à mercê de um pequeno grupo de energúmenos que, sem compreender a grandeza do seu gesto, o apelidou de "traidor" e de outros epítetos de igual gabarito.
Em menos de nada, o dr. Vital Moreira subiu à categoria de vítima (uma categoria particularmente cobiçada por qualquer socialista que se preze), enquanto os seus agressores desciam a níveis inqualificáveis. Até o nosso Nobel, um velho e reconhecido combatente da liberdade, defendeu, com grande espírito de tolerância, a expulsão imediata dos eventuais militantes do PCP que terão estado na origem do desacato – embora reconheça humildemente que não sabe a proveniência partidária dos elementos que, desde já, quer expulsar. Um pormenor que, como se vê, não afecta as grandes consciências que nos caem em sorte.
O PS, por sua vez, tenta compreensivelmente encontrar uma Marinha Grande que o salve do desastre desta campanha: enquanto o seu candidato garante que foi agredido por militantes comunistas – "está-lhes na massa do sangue", como o próprio deve saber, depois de anos de feliz convivência – o dr. Vitalino Canas exige um pedido de desculpas formal por parte do PCP pelo "caldo de cultura" que criou na sociedade portuguesa. A exigência, infelizmente, não teve a resposta adequada e, neste momento, é já o próprio PCP que exige um pedido de desculpas ao PS pelo facto de este lhe ter exigido um pedido de desculpas – e assim se vai transformando um drama sem sentido numa triste farsa do regime.
Há, no entanto, formas mais eficazes de o PS alcançar este seu louvável objectivo. A bem de uma nova Marinha Grande e dos seus hipotéticos benefícios eleitorais, o partido pode sempre enviar o primeiro-ministro para as manifestações que se organizam contra as "políticas de direita" do seu magnífico Governo. Esta iniciativa, sim, teria um sucesso mais do que garantido: tabefes em barda, insultos aos molhos e o precioso ámen desse grande democrata que é José Saramago.


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